Teoria dos atos administrativos: convalidação da forma na ação de improbidade

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Na prática forense, é comum o advogado se deparar, sobretudo nas ações de improbidade administrativa, com acusações em que seu objeto central trata de erros ou falhas nos procedimentos legais determinados em lei — vide Lei de Licitação — e que acabam por originar a citada ação.

Noutras palavras, a inobservância do rigoroso formalismo legal acaba maculando procedimentos licitatórios o que podem eventualmente ocasionar responsabilização por improbidade.

Por outro lado, nas ações de improbidade, em que a tutela jurídica visa proteger a coisa pública, não nos parece correto considerar que a não observância de todo e qualquer ato formal leve inquestionavelmente e necessariamente a dano a coisa pública.

Deve-se, portanto, verificar o que ocasionou a inobservância no formal e o que de fato isso gerou à coisa pública.

Nesse sentido, surge a possibilidade, nas ações de improbidade, dentro do controle judicial de legalidade dos atos administrativos, quando evidenciada a inobservância de determinado ato formal, da aplicação da convalidação do ato administrativo, ou seja, quando possível, validar o ato mesmo eivado de vício, pelo Poder Judiciário.

Assim, mesmo havendo vício no ato, poderá ser convalidado quando possível de ser sanado pelo controle judicial dos atos administrativos.

O tema é de extrema relevância dentro do Direito Administrativo, especificamente nas ações de improbidade administrativa, que têm em suas entranhas natureza sancionadora.

Nesse sentido, necessário explorar o conceito da teoria dos atos administrativos:

Segundo Hely Lopes Meirelles: “Ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria” [1].

A teoria dos atos administrativos nos demonstram que, para a validade dos atos praticados pela administração, é necessário uma observação integral sobre o processo, verificando todos os elementos do ato administrativo.

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Sendo assim, toda manifestação da administração pública nas suas tarefas corriqueiras é conceituada como ato administrativo, que deve obedecer a aquilo previsto em lei, em conformidade com o princípio da legalidade.

Dito isso, ressalta-se que, para formação de tais atos administrativos, é necessário o preenchimento e formação de cinco elementos, isto é: competência, finalidade, forma e motivo.

Considerando eventual inobservância formal que levou à ação de improbidade administrativa, necessário atenção especial quanto à forma, isto é, o procedimento determinado por lei, necessário para que o ato se exteriorize.

Nas palavras de Di Pietro, é conceituado como “uma concepção restrita, que considera forma como a exteriorização do ato, ou seja, o modo pelo qual a declaração se exterioriza; nesse sentido, fala-se que o ato pode ter a forma escrita ou verbal, de decreto, portaria, resolução etc” [2].

Um exemplo do elemento “forma” seria o edital do processo licitatório, que exterioriza como o certame, isto é, como o ato administrativo deve ocorrer.

O vício na forma consiste na omissão ou na inobservância irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato.

O ponto nevrálgico da presente argumentação situa-se aqui:

Seria possível a convalidação do ato administrativo com vício no elemento forma na ação de improbidade?

Embora seja possível apontar determinadas inobservâncias de formalidades em eventual ato da administração, importante destacar que a Teoria dos Atos Administrativos considera que vícios quanto à forma podem ser convalidados, a depender da situação.

Alexandrino afirma, que “em regra, o vício de forma é passível de convalidação, vale dizer, é defeito sanável, que pode ser corrigido sem obrigar à anulação do ato” [3].

No mesmo sentido, CARVALHO FILHO diz:

“Não obstante, é preciso reconhecer que a análise da adequação da forma à lei exige carga de comedimento e razoabilidade por parte do intérprete. Em consequência, haverá hipóteses em que o vício de forma constitui, em última instância, mera irregularidade sanável, sem afetar a órbita jurídica de quem quer que seja; em tais casos não precisará haver anulação, mas simples correção, o que se pode formalizar pelo instituto da convalidação do ato” [4].

Desse modo, nas situações em que o vício não atinge a esfera de direito do administrado ou não afeta o ato em seu próprio conteúdo, ele representará mera irregularidade sanável, podendo ser corrigido por convalidação.

Por conseguinte, a doutrina é sustentada pela legislação, que é clara no mesmo sentido. Vejamos:

LEI nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração.

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Nesse sentido a jurisprudência reforça o entendimento pela convalidação do ato administrativo, quando sanável, assim como se extrai da recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo:

APELAÇÃO. Nulidade de ato administrativo. Guarda Municipal. Indaiatuba. Demissão do serviço púbico após regular procedimento administrativo. Controvérsia que reside na competência da autoridade que subscreveu a penalidade. Convalidação do ato pelo Prefeito Municipal. Vício sanável sujeito à convalidação, que não tem prazo legal para ser efetuada. Sentença mantida. Recurso não provido. (TJ-SP – AC: 10039815720208260248 SP 1003981-57.2020.8.26.0248, relator: Bandeira Lins, data de julgamento: 28/4/2022, 8ª Câmara de Direito Público, data de publicação: 28/04/2022)

No caso, o apelante alegou que o ato administrativo de demissão seria nulo por ter sido assinado pelo secretário municipal e não pelo prefeito como estaria determinado em lei municipal.

Nesse sentido, a decisão possibilitou a convalidação do ato por considerá-lo “sanável” pela administração pública.

Em seu relatório, a decisão cita as lições de José dos Santos Carvalho Filho, que afirma: “são convalidáveis os atos que tenha vício de competência e de forma”.

Sendo assim, fica claro que, não havendo prejuízo ao interesse público, característica atinente ao elemento finalidade da citada teoria administrativa, não há que se falar em irregularidade.

Os rigorosos procedimentos legais que são exigidos em licitações são necessários na medida que impedem a desigualdade na disputa do objeto do certame, e garantam uma disputa isonômica. Essa ideia precisa estar atrelada ao princípio da finalidade, que em sentido amplo, sempre objetiva o interesse público.

A convalidação do elemento forma, em determinadas ocasiões, portanto, parece ser conveniente quando a falha não afeta a finalidade do certame, não levando a eventual condenação por improbidade administrativa.

REFERÊNCIAS:

[1] MEIRELLES, Helly lopes. Direito administrativo brasileiro. 42ª ed. São Paulo: Malheiros Editoras LTDA, 2016.

[2] DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito administrativo. 33. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

[3] ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo: descomplicado. 29ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021.

[4] CARVALHO FILHO, Jose dos santos. Manual de direito administrativo. 34ª ed. São Paulo: Atlas, 2020.

link conjur: https://www.conjur.com.br/2022-set-13/matheus-carvalho-convalidacao-forma-acao-improbidade

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